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sábado, 31 de dezembro de 2016

A VOZ E A ESCUTA

Nada mais revelador do que a própria voz a desnudar e sentenciar as convicções inconfessáveis em uma roda de pelo menos um estranho, ou com quem não se tenha uma cumplicidade inequívoca. Nada mais assombrador que a sonorização do caráter em viva voz a estampar a grossa estampa de quem se apresenta em gritante contraste do que em pretensa privacidade realmente é e se gaba pela sagacidade atroz e a perversidade cruel. Aqueles que em público são afagados com apertos de mão, abraços e uma fala totalmente voltada a eles, como se suas mazelas são a vital importância para agir em prol dos mesmos. A eles, de fato, estão direcionados o desprezo, a irrelevância e a desconsideração. A eles, em restrita e sigilosa prosa, o tratamento desrespeitoso, vil e mesquinho. Nada mais assustador do que a sintonia entre vozes distintas, sotaques diferentes, mas harmonia no conteúdo, que nos faz sentir mais descrentes. E que conteúdo. Nada mais vergonhoso do que uma voz que emite o som da arrogância, prepotência, com a finalidade única de bajular, rebaixando o semelhante, menosprezando e aviltando a indesejável situação desses tantos, os quais, vítimas também da desfaçatez e inconsequência de quem se propõem a “trabalhar” por eles. Nada mais patético do que uma voz descoberta com seu real ruído; pífio, se não fosse trágico. Nada mais constrangedor, porém esclarecedor, a quem pode ouvir a voz emanante de um farsante vociferante, colhido em flagrante. Nada mais impressionante do que a voz concordante do outro falante. Que tempos esses nossos. Nada mais nos resta ouvir dessas sinistras vozes? Vozes que gorjeiam em público, com o canto da esperança e da eterna vocação em servir, mas que, alcoviteiras, matraqueiam desdenhando e chacoteando. Nada mais é preciso ouvir de uma voz que tripudia e ridiculariza a condição humana como se superior fosse. Não há novidade alguma nessas vozes e no que de fato em reservado falam, a novidade é o retrato falado por ela própria e revelado a todos. Triste figura a protagonizar o esquete dantesco de um diálogo repugnante. Nada mais desconjuntado que a voz arrependida pelo silêncio que não fez, chamando por clemência por um momento de intensa intimidade e de malfadado mau gosto. Eis assim que a voz veio a público. Ela se esquece, a voz, que “não se pode culpar o vento em cujos seus segredos forem contados se ele os soprar às árvores”, ensina Kalil Gibran.
29/03/2016
Luiz Cláudio dos Reis Campos