No início dos anos setenta, lembro que aos sábados pela tarde. Na velha rua Coronel Manoel Borges, bem no coração de Uberaba, funcionavam, a Sociedade Rural do Triângulo Mineiro, em frente a farmácia São Sebastião e Banco Comércio e Indústria, à direita, a Padaria Brasil — com suas roscas e pães de sal ainda quentinhos —, a Grutinha Santa Luiza, Nando Loterias, a Tabacaria Sumaré, o Bar do Mosquito, o Barros e Borges, farmácia Triângulo e a relojoaria, onde os ponteiros pareciam bater mais devagar, e, ao fundo, um vão discreto entre um casarão antigo.
Rua Cel.Manoel Borges.Foto colorizada İA.
Poucos notavam, mas quem morava ali sabia: era a entrada para um pequeno mundo de calçadas de paralelepípedos gastas e histórias longas. O chão guardava os passos de gerações inteiras, num corredor estreito onde funcionava à direita meio escondido sob uma marquise de zinco, o Manogra, não era só um salão de sinuca — era um ponto de encontro. Os mais jovens e velhos se reuniam ali para partidas demoradas, conversas baixas, piadas antigas e cafés amargos. Era lugar de apelidos, rivalidades amistosas e olhares demorados sobre jogadas precisas. Muitos iam só pra ver. Outros, para cortar caminho, aproveitavam a sombra fresca do corredor e o murmúrio constante das conversas.
Hoje, quem passa pela rua Cel.Manoel Borges talvez nem imagine o que havia por trás daquele casarão. As vitrines mudaram, os sons silenciaram, mas a memória permanece, viva e pulsante, entre as frestas do tempo. Porque ali, naquele pequeno vão, Uberaba respirava — e a rua, em sua rotina discreta, guardava o eco de tudo que já foi. F. (Antônio Carlos Prata)