domingo, 28 de abril de 2019

Edgard Rodrigues da Cunha. O Advogado e o Mestre do Direito

A tecnologia atual, avançada, amenizou a importância da memória, mas certa desconfiança do que foi escrito ainda permanece. Entretanto, podemos afirmar que o que sobrou do passado foi a memória. A sua reabilitação como fonte parece ser a tônica da cultura historiográfica (cotidiano, realizações, construções, mentalidades inovadoras, crenças e outros). Segundo um autor, quando “o futuro frustra, o passado reconforta”. Neste cenário a preocupação da sociedade atual em pesquisar, procurar, reativar, revitalizar e recompor as origens, as raízes e as realizações de seus antepassados tem enriquecido a nossa história da formação e da nossa estruturação”

ELIANE MENDONÇA MARQUEZ DE RESENDE

Formação e Exercício Profissional

Edgard Rodrigues da Cunha nasceu na fazenda Cruz, situada no município de Uberaba, em 28 de abril de 1911, filho de Gustavo Rodrigues da Cunha e Maria Carmelita de Castro Cunha.

A primeira parte de sua infância transcorreu em Uberaba, indo posteriormente, com a separação dos pais e acompanhando sua mãe, residir na fazenda dos avós maternos, no município de Uberlândia.

Em 1924, com a reconciliação dos pais, voltou a Uberaba, residindo onde é hoje o Manhattan Shopping.

Realizou os cursos Primário e Ginasial no Colégio Marista Diocesano de Uberaba, finalizados, sendo coroado como orador da turma de 1930.

Formou-se em Direito, no Rio de Janeiro, em 1935, sendo contemporâneo e convivendo na então capital da República com os primos Afrânio e José Humberto Rodrigues da Cunha.

Edgar Rodrigues da Cunha

Formado, voltou a Uberaba, lançando-se no exercício profissional em época em que advogavam na cidade grandes nomes das Ciências Jurídicas, como José Mendonça, Aristides Cunha Campos, Lauro Fontoura, José de Sousa Prata e outros.

Por coincidência, instalou sua residência e escritório em frente à casa de José Mendonça, na rua Segismundo Mendes.

Paralelamente ao exercício da advocacia, dedicou-se ao Magistério, lecionando na hoje legendária Escola Normal Oficial de Uberaba, instalada na cidade em 1882.

Destacou-se na advocacia na segunda metade da década de 1940, em defesa de dezenas de pecuaristas vitimados pela queda dos preços do gado zebu, em 1945.

Durante 20 (vinte) anos lecionou uma das disciplinas de Direito Civil na Faculdade de Direito do Triângulo Mineiro, fundada por Mário Palmério em 1952, colhendo, por seu desempenho magisterial e científico, homenagens como paraninfo, patrono e homenageado especial por diversas turmas de formandos.

Casou-se em 1942 com Maria Júlia Junqueira, que havia cursado até o terceiro ano de Direito e lhe deu valioso apoio. Tiveram cinco filhos.

Pai e Companheiro

Falar de um pai tão presente, de um homem de múltiplas facetas, não é tarefa fácil! Relembrar uma vida tão intensa em atividades e tão densa em realizações!

Pai atuante na sociedade, mas nem por isto distante! Enérgico sim, mas carinhoso à sua maneira. Pai presente em todos os momentos bons ou ruins de nossas vidas! 

Pai orgulhoso de nossos feitos e das conquistas da cidade que tanto amou! Um homem à frente de seu tempo!

Sua visão de mundo nos deixava admirados. Com ele aprendemos a enxergar fronteiras distantes, a desvendar e conhecer o mundo. Aprendemos que o conhecimento é indispensável para se obter o sucesso!

Aprendemos com ele a ter medo do medo.

Ele nos ensinou que a audácia é necessária para vencer barreiras e atingir objetivos. Que a honestidade não é qualidade, mas obrigação!

Dizia-nos que é preciso pensar grande e que as desventuras que porventura vierem devem ser enfrentadas de cabeça 
erguida! Que a vida tem que ser vivida com alegria e que o homem quando para começa a morrer![....] Este homem com certeza, pela lição de vida que deixou, merece ser lembrado por ocasião de seu centenário.

Maria Carmelita R. Cunha


Pensamentos e Conceitos

Em notável discurso como paraninfo da turma da Faculdade de Direito do Triângulo Mineiro de 1971, que teve como orador dos formandos o futuro juiz de Direito em Goiás, Murilo Amado Cardoso Maciel, afirmou a respeito da advocacia:

“Ingressais, certamente já ouvistes estas palavras, agora, na mais bela das profissões liberais que o homem pode escolher.

A mais bela porque, defensores da honra, da liberdade e dos bens de vossos semelhantes, tereis, muitas vezes, que enxugar as lágrimas dos oprimidos, conter as injustiças do opressor e a contumélia dos arrogantes e descer ao calabouço em que se encontram os encarcerados.

Já disse alguém que a advocacia supera todas as outras profissões em requintes de beleza, finura de espírito e prazer. Voltaire chegou a dizer: eu desejaria ser advogado; é a mais bela profissão do mundo.”

Contudo, advertiu, após esplêndida citação de Fiot de la Marche atinente à profissão:

“Para ser advogado, não basta receber o diploma.

É preciso algo mais. É necessário integrar-se na profissão. É preciso amá-la e vivê-la.

Para bem desempenhá-la é preciso, conforme disse o insigne mestre do Direito, Mendes Pimentel, ter talento, trabalho, fé e coragem.”

E ponderou, lúcido:

“Já dizia Von Ihering que o escopo do Direito é a paz, mas o meio de consegui-la é a luta. O Direito é luta. Luta incansável em defesa do interesse material e moral do homem.

Isto não quer dizer que se deva levar a luta aos extremos da incompreensão e do fanatismo. Muitas vezes se ganha mais transigindo do que permanecendo irredutível em posições.

Lembrai-vos que ainda vale o velho e sábio adágio popular – “é preferível uma ruim composição a uma boa demanda.”

Já sobre o Direito, parafraseando José Higino, intérprete de Ihering, ensinou:

“A medida do Direito não é o absoluto da verdade, mas o relativo do fim.

Um mundo novo abre-se diante dos olhos maravilhados dos homens.

Os satélites artificiais, fabuloso instrumento de aproximação dos homens, as naves interplanetárias que já vão à Lua e a Marte, estão a exigir a criação de um novíssimo Direito [....] Uma nova roupagem é unanimemente reclamada para o Código Civil, Código Penal e Direito Comercial.”

Antevendo o futuro do país, proclamou:

“O Brasil deixou de ser uma nação deitada eternamente em berço esplêndido. É um país que caminha conscientemente para os seus altos destinos no seio das demais nações. 

É agora um país que inicia a sua grande decolagem para entrar no rol das grandes potências.

Urge, portanto, que nos preparemos devidamente para que esta nossa entrada seja devidamente observada, comentada e aplaudida.”

Em outra ocasião, como paraninfo de nova turma de bacharelandos em Direito, sintetizou de maneira categórica e absoluta:

“Jamais devereis esquecer que o essencial na profissão não é ganhar a vida, mas construir uma vida.”

DR. EDGARD, O PROFESSOR

O professor Edgard lecionava Direito das Sucessões no curso de Direito da então Faculdade de Direito do Triângulo Mineiro, hoje UNIUBE. Era professor dedicado, exigente, ao mesmo tempo, atencioso e amigo de seus alunos. Suas aulas tinham grande conteúdo e seu autor de referência era Carvalho Santos. Nelas caminhava com voz firme e com fichas nas mãos por onde se orientava. Foi, sem dúvida, um professor marcante que seus discípulos jamais esquecerão.

Nas agradáveis conversas, quando já no final da vida, repleta de vitórias, contou-me as dificuldades pelas quais passou como estudante no Rio de Janeiro, onde aprendeu alemão com pessoas que residiam na mesma pensão e que haviam refugiado da Guerra, e sua opção por advogar em Uberaba, onde só existiam profissionais consagrados. 

O professor Edgar, que tanto ensinou, lembra sempre a famosa frase de Horácio “Não morrerei por inteiro”.

Claudiovir Delfino

A Faculdade de Direito do Triângulo Mineiro, à avenida Guilherme Ferreira, hoje 
Uniube campus I, tinha as grandes e arejadas salas de aula no primeiro andar: primeira sala, 1º ano; segunda sala, 2º ano, e assim até a quinta sala, a última, com suas janelas para a rua Carlos Rodrigues da Cunha. Já na virada da esquina, começávamos a tremer, pois, em breve, enfrentaríamos o Robespierre, o temido e exigente professor 
dr. Edgard Rodrigues da Cunha, que ministrava o 
Direito de Família, encerrando todos os volumes que havíamos estudado do dr. Washington de Barros Monteiro.

Ali, na sala de aula, na cátedra, estava ele, prestando aos seus alunos o concurso da sua inteligência viva, seu raciocínio rápido e o brilho da sua cultura. As questões do Direito em geral, especialmente da sua área, as questões econômicas, os problemas do ensino, as falhas da nossa legislação, todas as controvérsias, ideias e iniciativas, porque homem pluridimensional, nele encontravam um batalhador persistente e esclarecido, revelando sua visão de futuro, seu constante trato com os livros e com os estudos, o que resultava na análise conscienciosa das questões que debatia e elucidava.

Liana Mendonça

Edição do Jornal da Manhã do dia 18/04/2011



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