terça-feira, 8 de maio de 2018

O COMPUTADOR CHEGA AO SERTÃO


           A possibilidade de comprar num supermercado – por menos de mil reais – um computador mais poderoso do que aqueles que a NASA usava nos anos 1970 para colocar o homem na Lua já é uma coisa assustadora. Mais ainda porque qualquer um de nós pode de sair carregando esse computador no bolso da calça, conectado a uma rede mundial que nos permite buscar informações em qualquer lugar do planeta. Milhões de pessoas fazem isso todos os dias quando compram e habilitam um aparelho celular tipo “smartphone”, ou “telefone esperto” – que reconhecem o seu rosto, entendem a sua voz, armazenam as suas fotos, filmes e músicas. E permitem o uso de programas (ou “apps”) capazes de desempenhar as mais diferentes tarefas.

          Facilidades com que os astronautas das espaçonaves Apollo nem sonhavam. Mas os primeiros computadores pessoais (ou PCs) que podiam ser levados para casa só surgiram nos anos 1980. E o lançamento do primeiro iPhone tem pouco mais de 10 anos. Nos anos 1970, computadores eram coisas misteriosas e um tanto assustadoras. Filmes como “2001 - uma Odisseia no Espaço” e “Geração Proteus” os retratavam como máquinas temperamentais, prestes a assumir o controle do mundo e destruir a humanidade. Na vida real, havia grandes computadores conhecidos como “mainframes”, que ocupavam andares inteiros de prédios e custavam pequenas fortunas: o aluguel mensal de uma única máquina dessas em 1970 dava para comprar 20 fuscas novinhos. Só os bancos, grandes corporações e departamentos de governos tinham bala para ter um. A empresa símbolo dessa época era a norte americana IBM, maior fabricante mundial desses computadores.

O COMPUTADOR CHEGA AO SERTÃO 


         Uma lenda urbana conta que o sigla HAL, o computador enlouquecido do filme “2001”, teria sido inspirada pela sequência das letras anteriores no alfabeto. Se não é verdade é bem contada. Mas em 1971 a IBM anunciou que ia comercializar no Brasil um computador compacto, especialmente projetado para empresas pequenas “que agora poderão ter um computador”: o Sistema/3 modelo 10. Uma novidade mundial, que chegava ao País pouco tempo depois de ser lançada nos Estados Unidos. A máquina só era “compacta” na propaganda. Na verdade era um conjunto de equipamentos que, segundo o fabricante, cabia em uma salinha de 3 por 4 metros. O cérebro do monstrengo tinha o tamanho de uma geladeira grande. Vinha acompanhado de impressoras, uma mesa com teclado e com um monitor “tipo televisão” (opcional) além dos famosos leitores de cartões perfurados – nos quais eram armazenados os programas e as informações (quem viveu os anos 70 conheceu esses cartões ao fazer as apostas na loteria esportiva). Empresas com mais recursos podiam trocar os cartões por moderníssimos “diskettes” de 20 x 20 cm, que armazenavam o equivalente a 3 mil cartões perfurados ou “80 kilobytes de dados”. Uma façanha. Para demonstrar na prática o quanto o seu novo sistema era simples, prático e portátil, a IBM resolveu fazer uma exposição itinerante: um “road show” na linguagem do marketing. Para isso instalou um Sistema/3 numa sala montada dentro de um grande caminhão baú, como esses de mudanças. 

          O caminhão, que tinha ar condicionado e gerador próprio, viajaria pelo Brasil para mostrar que a informática agora estava ao alcance de todos. O roteiro de shows começou em outubro de 1971, na então moderníssima Capital Federal em Brasília, onde o novo sistema foi apresentado às autoridades. De lá, o “road show” tomou a BR -050 rumo ao sul, parando em Uberlândia, Uberaba, Ribeirão Preto, Campinas e daí para São Paulo. O computador finalmente chegava ao sertão brasileiro e Uberaba – por uma infelicidade da geografia – acabou em segundo lugar, atrás da vizinha e rival. Nos dias em que ficou estacionada na cidade, empresários uberabenses, políticos, estudantes e todos aqueles que tiveram a graça de receber um convite da IBM puderam ver com seus próprios olhos o funcionamento daquela máquina fantástica. Que comandava submarinos e naves espaciais no cinema, mas era vendida aos homens de negócio para cuidar de coisas tão prosaicas quanto a emissão de notas-fiscais, gestão das folhas de pagamento e cadastro de clientes. Ninguém imaginava que, 50 anos depois, centenas de milhões delas estariam sendo usadas para ouvir música e colocar fotos de aniversário das crianças nas redes sociais.


 (André Borges Lopes)