segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Flores de Ipê


Autor: Marco Túlio Oliveira Reis


Poderia falar dos ipês que florescem em agosto,
Das calçadas coloridas coberta com pétalas e folhas.
Poderia lembrar a caridade de Dona Aparecida do Hospital do Pênfigo,
Ou do carisma e bondade do Dr. Humberto Ferreira,
Poderia inserir nestes versos, a Praça da Gameleira, 
O assombro que o hospital Vera Cruz causava nos meninos,
A fumaça cheirosa do Café Mauad, 
O sinal sonoro da fábrica de tecidos,
As dálias da dona Margarida e a paz beneditina do mosteiro.

Mas as flores dos ipês da minha infância,
Quimeras delicadas de esperança,
Bocados abstratos de poesia,
Ainda restariam inertes no chão...

Poderia lembrar pessoas que me fizeram rir,
Poderia brincar na rua os brinquedos que aprendi,
Poderia imaginar os vitrais da Santa Terezinha, 
A árvore “candelabro” que Silvério plantou.
As roscas frescas e macias da Dona Mariquinha, delicado sabor...
Poderia falar do circo, do parque, da roda de capoeira,
Poderia andar de bicicleta pela contramão,
Poderia balançar nos troncos das seringueiras,
Até sentir o aroma suave do jasmineiro do quintal da minha avó.

Mas as flores dos ipês da minha infância,
Quimeras delicadas de esperança,
Bocados abstratos de poesia,
Ainda restariam inertes no chão...

Poderia mudar os caminhos,
Poderia subir nos muros, nas casas, nas árvores da rua...
Poderia imitar o poeta e caminhar nas abas do viaduto...
Poderia retardar o prenúncio da primavera,
Poderia banhar-me nas águas frias do córrego da rua de baixo,
Esfolar os joelhos nas tapiocangas avermelhadas ou nas folhas do buriti
Poderia passar horas a fio, em leituras de nuvens ou prendendo sacis...
Poderia mirar indolentes instantes, as borboletas no meu jardim,
Amarrar cigarras e vê-las rodear, zunindo em volta de mim... 

Mas as flores dos ipês da minha infância,
Quimeras delicadas de esperança,
Bocados abstratos de poesia,
Ainda restariam inertes no chão...


Uberaba (MG), 30 de agosto de 2017.