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quinta-feira, 28 de setembro de 2017

Jerry Lewis - Ator e Diretor


O BAGUNCEIRO ARRUMADINHO
E O PROFESSOR ALOPRADO
Os Meros Pretextos


Guido Bilharinho

Jerry Lewis - Ator e Diretor
Jerry Lewis, como Chaplin, foi ator e diretor. Como ele, iniciou a carreira cinematográfica sendo dirigido para, depois, auto-dirigir-se.

         Em ambos, há que se distinguir um do outro ou um e outro. Como atores cômicos ninguém os superou em suas épocas.

         Em Lewis, o contorcionismo corporal, versatilidade e adaptabilidade facial às situações e a flexibilidade comportamental atingem graus e momentos inexcedíveis.

         Em dois dos filmes que atuou, O Bagunceiro Arrumadinho (The Disordely Ordely, EE.UU., 1965), de Frank Tashlin (1913-1974), e O Professor Aloprado (The Nutty Professor, EE.UU., 1963), que dirige, aqui destacados exemplificativamente, essas características são facilmente perceptíveis, tanto quanto em outros filmes, com maior ou menor incidência.

         Mesmo descontando-se os efeitos especiais proporcionados pelo cinema, talvez mais do que em qualquer outro de seus filmes (como ator e/ou como ator/diretor), é mais notável em O Professor Aloprado sua versatilidade, extremada em tipos totalmente diferentes e antagônicos como do professor e de Buddy Love. Tudo que um não era e não tinha o outro não só apresentava como o fazia em grau acentuado. Presença, voz, aparência, atitudes, comportamento, desenvoltura, visão do mundo ou da vida, mostram-se tão diferenciados e antípodas que dificilmente poder-se-ia imaginar possível na mesma pessoa antes de se assistir a esse filme.

         Em O Bagunceiro Arrumadinho enfatiza-se sua capacidade de transformar os atos e funções comezinhos e de fácil desincumbência em acontecimentos inusitados quando não inauditos, amalgamando-se nessa atuação atributos interpretativos, conteúdo, forma e consequência de seu desempenho perfazendo interação tão absoluta quanto, em decorrência, perfeita. Como mágico que transforma objetos e corpos, Lewis altera os fatos, infundindo-lhes natureza distinta da que sua congenialidade impõe. Um mundo prático e ordenado transforma-se num caos, porém, como o título original indica, caos ordenado e, de tão ordenado, previsível.

         Em O Professor Aloprado, da mesma forma, modifica-se a natureza, só que, desta vez, do próprio indivíduo.

         Por sinal, tanto faz Lewis ser dirigido como dirigir-se, porque o destacável, antes de tudo, é sua performance.

         Porém, cinematograficamente, esses filmes, tanto quanto os demais, carecem de importância. Do mesmo modo que ocorre com Chaplin, apenas constituem espaço e possibilidade de suas exibições como atores cômicos, que, sem o cinema, seriam exercidas nos palcos de circos e teatros, como, aliás, percebeu um crítico paulista, anteriormente citado, Paulo Emílio Sales Gomes, em relação a Chaplin, no artigo “Chaplin é Cinema?”.

         Os filmes propriamente nada contêm de cinematográfica e artisticamente relevante ou mesmo irrelevante, visto que se situam fora dos parâmetros estéticos, por miméticos, convencionais e lineares, objetivando apenas divertir.
         Sua perfeição técnica, competência direcional e a utilização dos recursos da câmera não lhes imprime nenhum dos atributos que caracterizam a obra de arte, não obstante merecerem ser salientadas apenas como tais, sem outras implicações.

         Do ponto de vista temático também nada aduzem de importante, conquanto assimilem e dêem curso adequado, ainda que superficial, a certas contradições do dualismo da natureza humana (do bem e do mal, do médico e do monstro, perfilhadas em O Professor Aloprado) e das descobertas freudianas do recalque de traumas e suas consequências e a possibilidade de sua resolução com a libertação do indivíduo das amarras que o bloqueiam.

         Ambos os filmes assentam-se, todavia, em esquema romântico bastante idealizado, no interior do qual essas questões básicas da condição humana diluem-se por sua instrumentalização meramente pretextual.

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Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão de 1980 a 2000 (https://revistadepoesiadimensao.blogspot.com.br/) e autor de livros de literatura, cinema e história do Brasil e regional, publicando atualmente no Facebook os livros Obras-Primas do Cinema Brasileiro e Brasil: Cinco Séculos de História.

sábado, 2 de setembro de 2017

Jerry Lewis - Ator e Diretor



MOCINHO ENCRENQUEIRO

Realidade e Comicidade


Guido Bilharinho


A comicidade de Jerry Lewis (1926-2017), ator e cineasta, advém da conjunção de dois fatores, que compõem distintos níveis estruturais de seus filmes.

           Um, a subversão da normalidade, que direciona a narrativa, imprimindo-lhe orientação precisa e coordenada visando extrair dos fatos a hilaridade ao interferir na sua articulação interna.

          Outro, sua performance como ator, implicando em desenvolvida capacidade histriônica e atilada percepção dos meios e modos corporais, faciais e comportamentais apropriados.

         Isoladamente, cada um desses elementos não produziria o resultado pretendido e alcançado, visto que as situações vivenciadas exigem ambos para agasalhar seus tipos e maneira de agir.

  Há, pois, perfeito entrosamento entre eles, num inter-relacionamento (personagem/acontecimento/comportamento) orgânico e organizado, estabelecido segundo as normas indicadas e ditadas pelas possibilidades pessoais de Lewis.

         Sem ele, as ocorrências expostas careceriam de comicidade, já que, além da mencionada adequação entre indivíduo/personagem/fato, as subverte, circunstância que, se inocorrente, também não atingiria o efeito pretendido.

         O filme Mocinho Encrenqueiro (The Errand Boy, EE.UU., 1961), que Lewis dirige e no qual atua, enquadra-se nessa fórmula, que se o é, decorre de criação própria que, por sua vez, atende e corresponde à sua faculdade de estar e se posicionar no mundo, categoria superior à simples representação ou ao modo peculiar de ser e agir.

         A ação transcorrida em grande estúdio cinematográfico hollywoodiano é sucessão ininterrupta de atos procedimentais subvertedores, que, alguns, refugindo à sua iniciativa por conter carga própria de comicidade (as duas cenas do elevador), mas que sem sua presença não seriam tão significativas e, certamente, nem seriam divertidas, como as milhares de cenas de elevador, se também não fosse a sina da personagem de atrair sobre si certas dificuldades.

      Nas principais situações de alta comicidade, algumas resultam exclusivamente de seu modo de agir (cenas dos pacotes, da entrega do roteiro de filme, do relógio de ponto, do manequim e do acompanhamento musical na sala de reunião da diretoria de estúdio), outras repartem-se entre sua atuação e a de outras personagens, cujos comportamentos também contêm doses de humorismo (o “almoço” na própria repartição e a venda dos feijãozinhos às crianças).

   A sequência do acompanhamento musical é antológica, revelando não só suas habilidades histriônicas como domínio dos ritmos musicais, permitindo esses elementos que se tenha uma das mais brilhantes cenas de pura interpretação, na qual a adequação e a sincronização gestual e facial de Lewis com o ritmo musical são perfeitas.

      À semelhança do ocorrente em outros de seus filmes, nesse acontecem também lances românticos alheios às influências jocosas, nos diálogos com os bonecos do palhacinho e da magnólia, que fogem inteiramente da ambiência fílmica, revelando outra (ou a outra) faceta da personagem.

      De todo modo, os acontecimentos fílmicos e a performance de Lewis não são cinematográficos, tendo valor próprio, independentemente do meio utilizado para sua consecução e expressão, podendo manifestar-se em palco de teatro, arena de circo, cena de rua ou estúdio de cinema, aplicando-se-lhe o que de Chaplin observou um crítico paulista, Paulo Emílio Sales Gomes, “Chaplin é Cinema?”. Mas, sem dúvida, o cinema não só os ampliam como infundem-lhes perspectivas de aproximação e movimentação inexistentes nos demais espaços.
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Guido Bilharinho é advogado atuante em Uberaba, editor da revista internacional de poesia Dimensão de 1980 a 2000 (https://revistadepoesiadimensao.blogspot.com.br) e autor de livros de literatura, cinema e história do Brasil e regional, publicando atualmente no Facebook os livros Obras-Primas do Cinema Brasileiro e Brasil: Cinco Séculos de História.